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terça-feira, 26 de abril de 2016

Você identifica a mentira pelo movimento dos olhos?



Por: Sergio Senna

Se você acha que uma pessoa está mentindo apenas observando o movimentos de seus olhos, é melhor pensar uma segunda vez.

Mais um estudo, publicado na revista PLoS ONE desmascara a concepção generalizada de que você pode afirmar que uma pessoa está mentindo pelo modo como seus olhos se movem. O movimento dos olhos não é um indicador confiável da mentira.

De acordo com os entusiastas e professores de programação neurolinguística (PNL), uma pessoa cujo olho se desloca para a esquerda significa que ela está lembrando de algo, enquanto uma mudança para a direita significa que ela está criando uma versão (em muitos casos, isso significa mentira). Perceba a inclusão da palavra “provável” no título da figura abaixo. Esse tipo de estratégia ajuda a “explicar” divergências no caso da técnica não funcionar.


Pesquisadores da Universidade de Edimburgo e da Universidade de Hertfordshire (Wiseman et al, 2012) realizaram uma série de experimentos para colocar esse credo da programação neurolinguística a teste.

Eles recrutaram 32 sujeitos destros, gravando-lhes os movimentos oculares quando mentiam ou diziam a verdade. Após a análise, não pareceu haver nenhuma conexão entre o movimento dos olhos e da veracidade ou falsidade das declarações dos participantes.

Em outro experimento, os pesquisadores mostraram a 50 voluntários alguns vídeos. Metade deles receberam informações sobre técnicas de detecção mentira pelo movimento dos olhos, proveniente da PNL, enquanto a outra metade não foi informada.

Eles foram, então, instruídos a identificar quais pessoas estavam dizendo a verdade ou mentindo. Com base nos resultados, os pesquisadores não encontraram nenhuma ligação entre o movimento dos olhos e dizer a verdade ou mentir. Também não houve diferença significativa na avaliação de exatidão dos que foram informados sobre PNL e os outros sujeitos.

Relacionar o movimento ocular com a mentira, simplesmente explicando para as pessoas que a área da imaginação fica em nosso lado direito do cérebro…. é pura fantasia e irresponsabilidade, pois já presenciei pessoas sendo acusadas de mentir com base nesse tipo de técnica de terceira categoria.
A mistura de informações e teorias é muito comum no campo da PNL, onde reina o ensino conduzido por pessoas sem formação técnico-científica sólida.
Ler um livro de técnicas de PNL é como ver a justaposição de partes de teorias sem qualquer compromisso com o rigor técnico na articulação de diferentes enquadramentos teóricos.
O cidadão comum e sem capacitação para analisar a viabilidade dessas fantasias literárias acredita que aquilo que está ali é científico (até porque falar sobre sua suposta base científica é uma técnica conhecida da difusão da PNL). Ele perceberá as falhas durante a tentativa de colocar seus conhecimentos em prática. 

Com base em evidências científicas (e.g. Thomason,  Arbucklet & Cady, 1980) , é possível dizer que  o movimento ocular está relacionado ao processamento de memória de longo prazo.
Nesse caso, seria possível utilizar esse indicador para perceber se a pessoa ensaiou uma resposta (caso não haja movimento ocular) pelo fato de não ter que “procurar” a informação em sua memória de longo prazo, o que é bem diferente de dizer que está mentindo!

As áreas do cérebro trabalham em conjunto  e bilhões de conexões garantem que umas se liguem às outras. Além disso, nosso sistema nervoso dispõe de plasticidade, em certos casos, outras áreas podem exercer as funções das regiões tradicionalmente conhecidas.

Veja abaixo uma representação simplificada das áreas envolvidas em nossas decisões morais. Então é óbvio que descobrir se alguém está mentindo não seria tão fácil assim….. Lembrando que, sob o ponto de vista psicológico, mentir não somente uma questão ligada à memória, mas principalmente ao nosso sistema decisório moral.

    Foto: Revista Época

A PNL tem sido um lucrativo negócio para alguns ao longo dos últimos quarenta anos. Não me oponho à difusão de qualquer conhecimento (acredita quem quer), mas sim à sua suposta e largamente propagada base científica com o propósito de seduzir as pessoas com um argumento de autoridade.
Vai o meu conselho: não acredite que algo é científico se não te mostrarem muito bem as suas fontes.

Texto Original: Ibralc

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